Política
e corrupção parecem acompanhar a saga humana na perspectiva do exercício do
poder. No Brasil, em particular, parece que acompanham - na como um mal
inevitável, como uma conjugação fatal. É como se a corrupção fosse parte
constituinte do ser político brasileiro.
No
entanto, de tempos em tempos, particularmente no período que antecede disputas
eleitorais, casos emergem e ganham o primeiro plano dos noticiários. Os
episódios atuais, são recorrentes, no entanto.
O
ingrediente novo parece ser a situação do PT neles, o partido que cresceu, se
afirmou e conquistou o poder do país ancorado em discurso anticorrupção, embora
não apenas. O novo é estar vendo também esse partido no lamaçal da corrupção.
Diante
disso, pergunta-se: afinal, será que estamos diante de uma conjugação
inevitável, fatal, entre exercício do poder político e corrupção? Ou ainda,
onde se situa a linha tênue que separa ação publicamente defensável do poder e
corrupção?
Custa
crer que essa conjugação seja um determinismo do exercício do poder. Por mais
que tenhamos dificuldades em separar a tênue linha que separa o exercício
publicamente defensável do poder e a prática corriqueira de levar vantagem, da
corrupção, acreditar nessa conjugação é desacreditar no ser humano, é, no
fundo, uma aposta no pior e no desastre da comunidade humana.
A
tentação à corrupção parece ser um fato normal no sentido de que aconteceu e
acontece. Ceder a ela, todavia, não é uma necessidade lógica de seu exercício.
Ceder e, de alguma forma, não ser punido, parece ser ainda pior, pois o crime,
nesse caso, é protegido por outro.
Nesses
tempos cartoriais, o parâmetro do legal e do ilegal é o texto da lei. A lei,
todavia, pode não ser necessariamente fonte autêntica de direito, porque pode
privilegiar e expressar interesses particulares às custas do interesse geral e
do bem comum. A propósito, há situações em que o texto da lei pode e deve ser
questionado para que o direito e a justiça possam prevalecer.
Por
exemplo, imaginemos uma ditadura receber vultosas quantias a título de
empréstimo, em condições desiguais, gerando uma situação de endividamento
externo sufocante do país. Imaginemos, também, que esse dinheiro, nas mãos dos
plantonistas do poder, sem a necessária legitimidade, desviam, gastam mal, em
suma, não geram a contrapartida que poderia justificar a obtenção do
empréstimo.
A
sociedade reconquista a autonomia, reassume o comando político, mas tem contra
si o fardo asfixiante da dívida herdada, que atua corroendo a capacidade de
governar e a legitimidade do mandato. A questão é: por que toda uma sociedade
deve pagar por uma dívida contraída por um governo sem legitimidade
institucional, no mínimo, duvidosa? Em situações como essa, a sociedade paga um
alto preço pela corrupção. A rigor, sempre paga caro por ela.
Nos
episódios recentes, correios, mensalão, por exemplo, salta aos olhos que o
problema vem de muito longe e é em mais amplo do que está aparecendo. Os fatos
que revelam ou insinuam corrupção remetem a prática política do dia a dia,
seguramente, de todos os partidos, que precisam de recursos para tocar suas
campanhas, tocar seus projetos.
Hoje,
o exercício da política foi mercantilizado e exige cada vez mais recursos
financeiros. Não há sinais de que esteja havendo uma mudança desse processo,
antes pelo contrário.
O
Supremo Tribunal Federal, por exemplo, com base no Artigo 26 da Constituição
Federal, reduziu em mais de cinco mil as vagas de vereadores nas câmaras
municipais de todo o país. A última eleição, outubro de 2004, confirmou essa
redução. O principal argumento para esse corte parece ter sido o da economia de
recursos.
Essa
redução, se constitui em um equívoco em pelo menos duas dimensões: na perspectiva
da economia e na perspectiva da democracia. Penso que não haverá economia e
contribui para empobrecer o caráter democrático de nossas comunidades. Nesse
sentido, foi uma decisão triste.
Da
perspectiva econômica, quem conhece a voracidade de políticos por recursos,
para se eleger e para manter suas bases eleitorais, não tardará em descobrir
que é pouco provável que haja economia de recursos. E se o repasse às câmaras
municipais diminuir, não necessariamente estará assegurado uma melhor utilização
dos mesmos por parte dos gestores.
Da
perspectiva da democracia, a redução parece uma decisão pouco feliz. O grande
problema de hoje, politicamente, é oportunizar canais viáveis de representação
política, já que a participação direta, nos molde da democracia ateniense, ou
da utopia assembleísta de Rousseau, por exemplo, estão cada vez mais distantes
do cidadão comum, sobretudo nas grandes cidades.
As
decisões precisam aproximar o cidadão das decisões políticas que lhe afetam a
vida e dos que decidem. E o que aconteceu com a redução do número de
vereadores? Afastou-se ainda mais o povo, o eleitor, o cidadão, dos eleitos. A
representação política, que já era frágil (a começar por episódios de mudanças
impunes de posições mesmo antes de assumir mandatos, no mais deslavado
desrespeito ao voto recebido, à inteligência e à dignidade), ficou ainda mais
frágil. Sendo assim, da perspectiva do fortalecimento da democracia e da
sociedade, o razoável seria uma decisão em sentido inverso, ou seja, um aumento
do número de vereadores.
A
questão ou dilema que se coloca é como ampliar e aprofundar a democracia sem
onerar os cofres públicos. No plano municipal, a equação não passa pela redução
do número de vereadores pelas razões acima expostas: ineficácia do ponto de
vista de uma economia de recursos e, sobretudo, pela fragilização e
empobrecimento da democracia representativa. A solução para esse dilema parece
ser livrar o mandato de vereador do caráter cada vez mais mercantil que vem
ganhando, o que a redução do número de vereadores aponta em sentido contrário e
o reforça ainda mais.
A
forma de fazer isso é desvincular o exercício de vereador de salários, tornando
gratuita essa participação, como já o foi em outros tempos. A propósito, a
qualidade dos ocupantes das câmaras não melhorou com a remuneração, ao
contrário, afastou cidadãos que podem e querem contribuir com sua comunidade,
mas não suportam a idéia (e muito menos a prática) de conquistar uma vaga em
condições cada vez mais mercantis, em que o eleitor, utilizando expressão de
político regional, “faz do voto sua peixeira” contra o pretendente político e
trata de obter vantagens ou compensações, sob a forma de bens, de recursos ou
de promessas de cargos entre outras, dependendo do seu nível sócio-econômico.
Trata-se
de uma solução muito simples, ainda que de difícil aplicação, em função da
mercantilização da prática política, agora também reforçada.
Assegurado
o caráter de gratuidade do exercício de vereador, resolvendo desta forma o
problema da economia, a questão passa a ser o número de vereadores. Dado que
democracia é participação, número é importante. Nesse sentido, o numero atual
pode e deve ser multiplicado várias vezes, assegurando, por exemplo, que cada
unidade geográfica ou cada distrito eleitoral municipal (bairro, agregação de
bairros, povoados ou distritos rurais, por exemplo), tenham um representante a
cada conjunto de eleitores, devendo variar esse montante em função do tamanho
populacional de cada município.
A lei
poderia estabelecer limites mínimos e máximos segundo categorias de grandeza
populacional de cada município e cada comunidade decidiria sobre sua
representação política. Com isso, sem comprometer o princípio da economia de
recursos financeiros, estaríamos solidificando e alargando as bases da nossa
democracia. Do contrário, apesar das boas intenções,colheremos os frutos
amargos da elitização e da mercantilização e seremos testemunhas do paradoxo de
situações de população pobre e emergentes ocupantes de cargos políticos com
trajetórias econômicas ofuscantes.
A
remuneração do cargo de vereador não é uma necessidade lógica da democracia, é
resultante de uma decisão política que pode ser mudada. A julgar pelos efeitos
da mercantilização crescente do voto sobre os que pretendem disputar uma vaga e
sobre os que votam, tornar gratuito o mandato para vereador, eliminando o
pagamento de salários, não será um retrocesso, mas o descarte oportuno de um
entulho.
A
presente crise política, que foram centradas nas CPIs dos correios e do
mensalão, caso não queiram ser apenas mais um capítulo recorrente da história
política deste país, deve desembocar na reforma política e essa só será eficaz
se ampliar o conceito de democracia, exigindo a participação da população nas
decisões, requerendo proximidade do representante de seus eleitores. Nos
episódios recentes de corrupção, parece faltar, antes de tudo, democracia, ou
melhor, são reflexos de uma democracia insuficiente e mercantilizada.
Agenor Gasparetto (Sociólogo, editor da Via
Litterarum)
Polícia Cidadã
Para alcançarmos está
Polícia Cidadã é necessário antes de qualquer coisa que nós como cidadãos de um
país democrático tenhamos uma polícia desmilitarizada, há uma necessidade
urgente dessa transformação. Para que tenhamos uma Polícia Cidadã somente é
necessário que você Assine a nossa petição:
PETIÇÃO PÚBLICA PELA DESMILITARIZAÇÃO DAS POLÍCIAS E BOMBEIROS MILITARES
DO BRASIL!
Consciência Política PM&BM
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