A
perenização do presente
Hoje,
entramos na dinâmica do pensamento único, na idéia de que este modelo de
sociedade capitalista neoliberal é o ideal. Como disse Fukuyama, guru do
neoliberalismo, "a história acabou". Crer nisso é acreditar que não
há futuro.
Qual é a
lição que apresenta essa perspectiva? A perenização do presente. Querem nos
convencer que, daqui a 200 ou 500 anos, haverá shopping - Center, mercado,
Bolsa de Valores, competitividade, porque ninguém ousa imaginar algo diferente.
A menos que corra o risco de ser chamado de dinossauro ou maluco.
Ora, quem
conhece a história sabe que Alexandre Magno sonhou que a sua conquista do mundo
seria eterna. Os doze césares de Roma ambicionaram a mesma coisa. A Igreja, no
período medieval, achou que tinha chegado ao Reino de Deus. Hitler até ousou
chamar o seu projeto de Terceiro Reich, o reino definitivo da sua conquista, e
deu no que deu. Stalin, a mesma coisa na União Soviética. Eis uma grande
bobagem: a pretensão de que um momento histórico possa se perenizar.
O que há de grave, neste nosso momento histórico, é que não há uma proposta que se contraponha a esse modelo neoliberal de sociedade. Somos seres visceralmente vocacionados ao sonho. Somos o único animal que não pode deixar de sonhar. O único animal incompleto. Uma vaca está na sua plenitude bovina, feliz; o cachorro na sua plenitude canina, precisa só de uma comidinha, um carinho e fala consigo ao nos fitar: "Coitado, ele ainda tem que fazer reunião, discutir política, ler jornal, enfrentar problemas familiares". A samambaia precisa de muito pouco para ser feliz, um pouquinho de sol e água.
O que há de grave, neste nosso momento histórico, é que não há uma proposta que se contraponha a esse modelo neoliberal de sociedade. Somos seres visceralmente vocacionados ao sonho. Somos o único animal que não pode deixar de sonhar. O único animal incompleto. Uma vaca está na sua plenitude bovina, feliz; o cachorro na sua plenitude canina, precisa só de uma comidinha, um carinho e fala consigo ao nos fitar: "Coitado, ele ainda tem que fazer reunião, discutir política, ler jornal, enfrentar problemas familiares". A samambaia precisa de muito pouco para ser feliz, um pouquinho de sol e água.
Nós não.
Somos seres marcados pela incompletude e, por isso, a nossa completude só se
realiza no sonho. Temos que sonhar. O sonho pode ser um projeto político, uma
fé religiosa, um ideal profissional ou uma vocação artística. Somos seres
vocacionados à transcendência. Não nos bastamos.
A perda da
dimensão histórica do tempo coincide com a entrada de uma "cultura"
que, cada vez menos, se preocupa com aquilo que é o verdadeiro caráter da
cultura. Cultura é tudo aquilo que aprimora o nosso espírito e a nossa
consciência. Quanto mais consciência e densidade espiritual uma pessoa tem,
menos consumista ela se torna. Porém, cada vez mais a cultura é atrelada ao
consumismo. Perde o seu valor como fator de humanização para virar mero
entretenimento. Existe uma máquina publicitária que não está interessada em
formar cidadãos, está interessada em formar consumidores. A ponto de se estender
isso até à infância.
A erotização precoce
Quem já
chegou à idade média, como eu, sabe que, em nossa infância, não havia o fator
dinheiro. Ele apareceu na nossa vida quando entramos na adolescência. Nunca
tivemos a idéia de qual era a marca do calçado que usávamos, da roupa que
vestíamos, e a palavra grife nem existia.
Acontece que
o mercado infantil é o filé mignon do consumismo. Porque criança tem duas
vantagens: não ter discernimento frente ao valor do produto, nem do valor de
compra, nem do valor de uso, e ser capaz de insistir tanto, que os pais acabam
comprando para se verem livres da chateação, mesmo sabendo que aquilo vai ser
encostado em uma semana. No Brasil, o mercado infantil movimenta, por ano, US$
48 bilhões o equivalente ao faturamento mundial da Nestlé em um ano.
(Fonte: Época 5/6/2000).
Como se faz
uma criança virar consumidora? É difícil. Porque a criança é dotada de um
artifício natural que lhe serve de antídoto: a sua fantasia. Um menino ou uma
menina, de 4 ou 5 anos, brincando sozinho, é um bando.
A fórmula
para transformar uma criança em consumidora é pela via da erotização precoce.
Quando se consegue que uma criança de 4 ou 5 anos preste demasiada atenção ao
próprio corpo, ela entra na perspectiva do desejo de consumo. Passa a viver uma
esquizofrenia, porque é biologicamente infantil e psicologicamente adulta. Um
simulacro de adulto. Isso é mais ou menos administrável, porque ela consegue
jogar a fantasia, tanto na sua ambição de consumo, quanto no mimetismo ao
comportamento adulto. Acontece que, ao chegar à puberdade, ela vive uma crise,
como todos nós vivemos a crise da puberdade. A puberdade é o momento da
adequação da razão à realidade. É quando descobrimos que há uma inversão. A
fantasia passa ao segundo lugar e a razão ao primeiro. A infância é ótima,
porque a fantasia está em primeiro e a razão em segundo.
Essa
criança, marcada pela perspectiva consumista, chega à puberdade numa enorme
insegurança. O real é assustador. E, nesse momento, por uma perversa intuição
profissional, aproxima-se dela o traficante de drogas e diz: "Não se
preocupe, você vai poder continuar sonhando, só que quimicamente".
A questão da
droga está diretamente associada à eliminação da infância como espaço lúdico,
de criatividade, para ceder lugar ao consumo e à babá eletrônica, que sonha
pelo telespectador mirim. Na minha infância, felizmente, não havia a ditadura
da televisão e a gente brincava na rua. O máximo de consumo era pedir ao pai
que trouxesse, do centro da cidade, uma caixa de pregos, para montarmos os
nossos brinquedos. E havia todo um exercício de sociabilidade no bando de rua.
Hoje, há uma
caixa eletrônica que sonha pela criança e promove uma transferência. A família
quer incutir determinados valores, a TV propõe antivalores. Meu pai me impedia
de passar em determinadas ruas de Belo Horizonte, porque lá ficava a zona
boêmia da cidade. Hoje, você não pode fazer o mesmo. Basta seu filho ligar a TV
para o bordel entrar no quarto e na sala da casa. E, se bobear, ele ainda liga
para a tele pornografia e estoura a conta de telefone da família.
Vivemos,
pois, numa situação em que a vida volta a ter dimensão cíclica, não histórica;
e dentro dessa dimensão cíclica é difícil ter um varal onde dependurar os
valores. E o sonho como utopia ou projeto passa a ser quase um crime, uma
anomalia. "Não, você tem que aceitar essa sociedade tal como ela se
apresenta", diz o pensamento único.
A
perspectiva de perenização desse presente nos leva à síndrome da juventude
eterna. Já que o presente tem que ser perenizado, também a minha juventude tem
que ser perenizada. Malha-se o corpo, mas não o espírito. Hoje, ficar velho é
uma falta de educação; engordar, então, nem se fala. Vale a anedota:
- Como é, foi no enterro do
amigo?
- Fui.
- E como ele estava?
- Olha, com tudo em cima, morreu sarado...
- Fui.
- E como ele estava?
- Olha, com tudo em cima, morreu sarado...
Por Frei
Betto
Polícia Cidadã
Para alcançarmos está
Polícia Cidadã é necessário antes de qualquer coisa que nós como cidadãos de um
país democrático tenhamos uma polícia desmilitarizada, há uma necessidade
urgente dessa transformação. Para que tenhamos uma Polícia Cidadã somente é
necessário que você Assine a nossa petição:
PETIÇÃO PÚBLICA PELA DESMILITARIZAÇÃO DAS POLÍCIAS E BOMBEIROS MILITARES
DO BRASIL!
Consciência
Política PM&BM
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